quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Agropecuária no Velho Continente - Baixa sucessão familiar nos campos italianos

Baixa sucessão familiar no campo preocupa a Itália
Árduas jornadas e pouca rentabilidade são algumas das dificuldades enfrentadas
Luiz Patroni | Faenza (Itália)

A baixa rentabilidade e as árduas jornadas no campo são algumas das maiores dificuldades enfrentadas pelos produtores italianos. Mesmo apaixonados pelo campo, muitos não estão conseguindo transmitir o mesmo sentimento aos filhos. O principal resultado é o baixo índice de sucessão familiar, que preocupa produtores e entidades do setor. É o que você confere na última reportagem da série Agropecuária no Velho Continente.

A Itália é um dos berços da humanidade e Roma é um arquivo vivo desta história. Oficialmente a cidade tem 2764 anos, mas há indícios de que muito antes, outras civilizações já habitavam a região. É onde estão vários dos monumentos mais famosos do mundo, do Vaticano às ruínas do Coliseu. O passado se faz presente a cada rua.

Mas se na zona urbana as lembranças são eternizadas, no campo, é o contrário. A pouco mais de 400 quilômetros da capital, chegamos à área rural de Faenza, que se destaca na produção de frutas. Os pomares ocupam mais de 120mil hectares. São milhares de agricultores, que dividem algumas preocupações.


Além dos temas característicos da atividade, como ataque de doenças e pragas, custos de produção e rentabilidade, os produtores de frutas da Itália também estão preocupados com a sucessão familiar. Na região da Emilia Romana por exemplo, a faixa etária média de quem está no campo supera os 60 anos de idade. Jovens com até 30 anos, representam apenas 2% dos produtores.

O fruticultor Michele Berti é um retrato desta situação, aos 57 anos, toca praticamente sozinho a produção de ameixas, kiwis, pêssegos e nectarina. Apenas na época da colheita contrata um funcionário, e paga 15 euros por hora. A propriedade de 15 hectares supera a média nacional, estimada em apenas seis hectares. Além das frutas, aposta também na produção de energia com estas placas solares. Tudo para tentar ampliar os lucros, que segundo ele têm se tornado menores a cada ano. Aliás, este foi o motivo principal que afastou os seus três filhos do campo.

– Eu tenho orgulho de ser produtor, de tudo o que faço e estou fazendo. Mas meus filhos decidiram encontrar outro caminho para o futuro e eu concordei com isso. Não fiquei chateado com a decisão. Sei que se eu precisar de ajuda num fim de semana, eles estarão ao meu lado. Além disso, com outros empregos, eles poderão encontrar funcionários, vender ou arrendar a fazenda quando eu não tiver mais condições de tocar a atividade. Mesmo apaixonado pelo campo, não acho certo trabalhar muitas horas por dia, sem direito a fins de semana, e mesmo assim não estar satisfeito economicamente – desabafa o produtor, ressaltando ainda que para se manter competitivo na atividade a cada dia é preciso mais investimentos e que o mercado não remunera isso.

A consciência de que a realidade é bem diferente da de décadas passadas é compartilhada pela filha mais nova do produtor. Chiara Berti tem 25 anos, está concluindo a faculdade de economia e nem cogita a possibilidade de trocar a futura carreira pelo dia a dia no campo.

– No tempo do meu pai e do meu avô a produção de frutas já era uma atividade desenvolvida na região, só que era rentável e capaz de sustentar a família. A rotina era igualmente trabalhosa, mas havia retorno financeiro. Nós, jovens de hoje, gostaríamos de dar continuidade ao que nossos pais fizeram, mas também queremos mais. Buscamos elevar nosso nível de instrução, frequentamos universidades. Estamos certos que ficar no campo hoje não compensa financeiramente. Precisamos pensar num trabalho que compense o nosso esforço e nos dê perspectivas concretas. Este é o pensamento de muitos jovens nesta região – comenta a universitária.

O cenário preocupante acendeu o sinal de alerta das entidades que representam o setor. Marco Cestaro é diretor geral do Serviço de Produção Vegetal da região da Emilia Romana. Ele reconhece que a falta de sucessão familiar é um dos assuntos mais críticos na cadeia produtiva de frutas e hortaliças na Itália.

– Podemos intervir incentivando o homem do campo. Não podemos conceder créditos diretamente, já que isso impediria o livre comércio, o que é proibido pela Comunidade Européia. Mas podemos fomentar o uso de melhores variedades, pacotes tecnológicos e novas técnicas. Temos que modernizar o sistema agrícola do país, ampliando a tecnologia e direcionando a produção para mercados específicos. Começamos a fazer isso e já temos alguns resultados positivos. Não podemos deixar que as famílias abandonem o campo – conclui o especialista.

Enquanto os italianos buscam alternativas para frear o êxodo rural, o brasileiro Oradi Francisco Caldatto comemora. Produtor rural em Pato Branco, no Paraná, deu continuidade à produção que começou com os pais. Ele se orgulha de ter certeza de que a permanência da família no campo está garantida.

– Eu herdei parte da propriedade dos meus pais, o resto eu adquiri. O meu filho estudou na escola agrícola e está dando continuidade com muito amor, com muita dedicação e muito carinho. O meu neto, que é filho dele, está estudando na mesma escola que ele estudou. Então eu estou muito tranquilo nesta questão. Estou muito satisfeito, muito seguro, estou vendo que na minha propriedade eu tenho perspectiva de sucessão – afirma.

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